Biografia Silvana Mendes (n. 1991, São Luís, Maranhão, Brasil) é artista visual e pesquisadora cujas investigações atravessam raça, território, linguagem e imagem. Sua prática articula colagem digital, vídeo, pintura e fotografia, ativando narrativas visuais que desestabilizam a colonialidade inscrita nos códigos estéticos e na iconografia da história oficial. Mendes propõe dispositivos que afirmam a presença e a potência dos corpos negros na arte contemporânea brasileira, criando imagens que conectam memória, gesto e tecnologia. entre as exposições que participou nos últimos anos, destaque para “Um Defeito de Cor”, Museu de Arte do Rio – MAR/RJ, Empowerment – Kunstmuseum Wolfsburg Museum, Wolfsburg, Alemanha. Sua obra integra coleções como a do Museu Afro Brasil e projetos editoriais sobre arte e antirracismo.
Apresentação da Série: “Afetocolagens: Reconstruindo Narrativas Visuais de Pessoas Negras na Fotografia Colonial”
A série de colagens digitais recria imagens de pessoas negras que (res)existiram nos processos de colonização no Brasil na segunda metade do século XIX. As fotografias de Alberto Henshel (1827-1882), considerado um dos primeiros donos de estúdio de fotografia no Brasil, foram desconstruídas de suas visualidades iniciais, até então vinculadas a sociedade escravista e reconstruídas em afetocolagens que ressignificam corpos, lugares e pessoas. Se por um lado, através de expedições fotográficas pelo nordeste brasileiro, Alberto Henshel registrava corpos negros impessoais calejados por uma sociedade escravista, neste trabalho esses corpos tornam-se pessoas com suas respectivas representações identitárias. Através de uma trajetória social, cultural e econômica o desenvolvimento da fotografia enquanto linguagem foi permeado por signos de poder como localização, classe, raça, gênero e entre outros marcadores sociais. Alberto Henshel tornou-se conhecido por contribuir ao desenvolvimento da fotografia, mas por outro lado, traz à tona questões sobre o imaginário social construído que aloca pessoas negras como legítimas ao sofrimento também presente na história da fotografia.
Nesse sentido, com objetivo de trazer uma dupla provocação que envolve ser afetado ou a capacidade de sentir diversos afetos, as afetocolagens transportam corpos tidos como objetos para um lugar conforto para existências pretas. Em contraponto aos racismos cotidianos e a constante reprodução de um sistema estrutural de sofrimento a corpos negros, este trabalho se preocupa em desfazer um conceito de fotografia criadora de esteriótipos racistas para criar uma semiótica possível de pessoas negras.
Dessa forma, através das afetocolagens, rostos são retirados de relações de dominação e inseridos em contextos possíveis de pessoalidade, expressividade e vida. A partir da obra “Negra Pernambucana”, mulheres são ambientadas entre paisagens e objetos que lhe oferecem agência sobre suas visualidades. Numa sociedade marcada pelo mito da democracia racial, a partir das colagens pode-se refletir sobre as feridas visuais carregadas nas imagens de pessoas negras através da história brasileira – objetificação, sexualização, domesticação, impessoalidade, maucaratismo etc. Como as pessoas negras estão sendo fotografadas nos dias de hoje? Quais signos suas imagens carregam atualmente? Como as mídias digitais contribuem para a disseminação dos estereótipos construídos sobre pessoas negras? Aponta-se para a necessidade de refazer as associações semióticas atreladas a pessoas negras.